O encontro com vítimas de abuso
sexual não está previsto na agenda oficial, mas é esperado em algum período
das 104 horas em que o Papa Francisco permanecerá em Portugal durante
esta semana.
Assim como
ocorreu em outros países afetados por escândalos de pedofilia na Igreja
Católica, o Pontífice não fugirá ao tema: deverá conversar com
testemunhas, mas sempre longe da exposição pública. Nesta segunda viagem ao país, Francisco vai
liderar a Jornada Mundial da Juventude — a quarta de seu
Pontificado.
Sob a
sombra do encontro, reside o relatório da Comissão Independente para o Estudo
dos Abusos de Menores na Igreja, que em janeiro passado apontou 4.815 vítimas
entre 1950 e 2022, a maioria com idades entre 10 e 14 anos. Pelo menos quatro
padres — entre mais de 20 denunciados — foram afastados pelas autoridades
eclesiásticas. Nos últimos
dias, os cenários mais conhecidos da capital portuguesa se encheram de
peregrinos católicos à espera do Papa, enquanto os lisboetas tratavam de deixar
a cidade às pressas, para fugir do caos provocado pela jornada.
Francisco
desembarca na quarta-feira (2), escoltado por caças da Força Aérea
Portuguesa. Mais de um milhão de pessoas deverão
participar, até domingo (6), das 19 cerimônias programadas com a
presença do chefe da Igreja Católica. A visita do Papa a Portugal
desatou controvérsias em relação aos gastos, que rondam os 160 milhões de euros
— parte deles em obras realizadas sem licitação. O
artista plástico Bordalo II materializou a onda de críticas num tapete de notas
gigantes de 500 euros que estendeu no altar-palco onde Francisco participará,
no sábado, de uma vigília e celebrará uma missa, no dia seguinte.
“Num Estado laico, no
momento em que muitas pessoas lutam para manter as suas casas, o seu trabalho e
a sua dignidade, decide investir-se milhões do dinheiro público para patrocinar
o tour da multinacional italiana”, justificou o artista em suas redes sociais
para a obra batizada de “Tapete da vergonha”. Estima-se que o governo português tenha
gastado 36 milhões de euros com a visita papal, e a
mesma quantia tenha sido investida pela Prefeitura de Lisboa. Com nove metros
de altura e capacidade para duas mil pessoas, o altar-palco
foi previsto inicialmente para custar 4,24 milhões de euros, mas, diante das
críticas, seu valor foi reduzido praticamente para a metade.
Outras polêmicas foram
expostas. O selo comemorativo da
jornada exibia a imagem do Papa, de pé, no Monumento dos Descobrimentos, numa
alusão ao Infante D. Henrique, e foi associada ao colonialismo e à ditadura
salazarista. Elaborado pelo artista
italiano Stefano Morri, o selo acabou sendo retirado de circulação,
embora 45 mil exemplares tenham sido impressos.
Disfarçado de operário,
Bordalo II não teve problemas em entrar tranquilamente num local que
deveria ser rigorosamente vigiado, e instalar o seu tapete de
notas de 500 euros no altar-palco, levantando outra preocupação – a segurança
do Pontífice durante a estada em Portugal.
Por Sandra Cohen
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